Velhices e territórios: um estudo interdisciplinar no concelho de Coimbra, Portugal

Abstract

Olhar as velhices a partir dos territórios; olhar os territórios a partir das velhices. Esta pode ser a frase que sintetiza, em parte, este estudo. Assim, partindo dos eixos das mobilidades, acessibilidades e sociabilidades, esta investigação tem por objetivo identificar as interdependências das relações estabelecidas entre as pessoas idosas e os territórios onde vivem e onde constroem seus laços, seus cotidianos, suas identidades, ou seja, identificar as influências mútuas que ambos os sujeitos trazidos ao estudo – velhices e territórios – exercem para a gestão e vivência tanto das velhices, quanto dos próprios territórios, a partir das relações por e entre eles estabelecidas e experienciadas. Para alcançar o objetivo, foi traçado um plano metodológico e conceptual interdisciplinar, no qual as disciplinas das ciências sociais e humanas (antropologia, sociologia, geografia, história, filosofia, educação e psicologia), bem como as áreas da arquitetura e do urbanismo, foram convocadas para que, cada uma delas, dentro de suas próprias especificidades, desse seu contributo para a compreensão e a interpretação das realidades observadas. Este estudo foi desenvolvido em quatro diferentes tipologias territoriais do concelho de Coimbra, duas delas tipicamente urbanas – a zona “Alta” do centro histórico, com uma história milenar, e a área da “Solum”, construída e desenvolvida a partir de planejamento urbano que teve início na segunda metade do século XX –, e as outras duas com características rurais, ainda que geograficamente próximas ao centro urbano da cidade: os lugares do “Botão” e do “Casal do Lobo”. A cartografia territorial, a partir de critérios geográficos, demográficos, arquitetônicos e urbanísticos, foi o instrumento escolhido para operacionalizar todo o trabalho, possibilitando uma melhor e mais ampla visualização e leitura das realidades estudadas. Para a elaboração dos cartogramas, optou-se pela recolha e análise de dados estatísticos e documentais. Também foram realizadas observações e descrições de cada um dos territórios do estudo – cujo registro fotográfico é aqui usado como recurso ilustrativo para a apresentação e caracterização dos territórios –, e, ainda, inquéritos, através de entrevistas semiestruturadas e não estruturadas com o intuito de caracterizar, nas suas dimensões estruturantes, a população idosa por território e, sobretudo, conhecer e compreender as relações das pessoas idosas com os territórios. O olhar interdisciplinar sobre a multiplicidade de relações que se estabelecem entre velhices e territórios permitiu detectar, por um lado, as dificuldades, vulnerabilidades, necessidades, medos, e, por outro, as facilidades vivenciadas pelos sujeitos idosos, assim como as estratégias desenvolvidas e utilizadas por estes sujeitos nas suas relações com os territórios. Assim, foi possivel perceber que os territórios podem representar um risco às pessoas idosas, no que tange às dificuldades de acesso e de mobilidade, podendo interferir, negativamente, em seus processos sociais, isolando-as e vulnerabilizando-as. Ao mesmo tempo, laços sociais fortes e horizontais podem minimizar as dificuldades de acessibilidade e mobilidade encontradas nos territórios. Nesse sentido, verificou-se a necessidade imperiosa de uma mudança social paradigmática a partir da proposta do desenvolvimento e da vivência de uma Ética do Cuidado, uma política que deve ser construída cotidianamente nas relações entre os vários sujeitos e agentes sociais, com o entendimento de que somos seres de cuidado: ao mesmo tempo cuidadores/as e suscetíveis de cuidado. A compreensão das lógicas estabelecidas nas diversas relações vivenciadas e significadas pelas próprias pessoas idosas a partir de como cada um dos territórios estudados se estrutura histórica, geográfica, sociológica e culturalmente, possibilitou a elaboração de sugestões de estratégias facilitadoras das relações entre velhices e territórios, envolvendo as várias instâncias e os vários atores sociais, no intuito de potencializar a qualidade de vida para todas as pessoas, particularmente as pessoas idosas.

Dealing with old age based on territories; dealing with territories based on old age. This sentence might well summarise, in part, this study. So, having mobilities, accessibilities and sociabilities as starting points, the aim of this research is to identify the interdependencies of the relationships between the elderly and the territories in which they live and build their ties, their daily life, and their identities. In other words, to identify the mutual influences that both old age and territories act on the management and experience of both old age and territories, based on the relationships established and lived by and between them. To achieve this objective, an interdisciplinary methodological and conceptual plan was delineated, in which social and humans sciences (anthropology, sociology, geography, history, philosophy, education and psychology) and the areas of architecture and urban planning, each with its own specificities, were all invited to give their contribution to understand and interpret the observed realities. This study covers four different types of territories within the municipality of Coimbra, two of which typically urban – the “Upper” part of the historical centre, with a century-old history, and the “Solum” area, built and developed in the early second half of the 20th century –, and the other two with rural characteristics, although geographically close to the city’s urban centre: the areas of “Botão” and “Casal do Lobo”. To make the work easier and to obtain a better and broader view and reading of the studied realities, territorial maps were used based on geographical, demographic, architectural and urban planning criteria. To prepare the maps, statistical and documentary data were collected and analysed, observations and descriptions were provided for each of the territories under study – the photos of which are used here to illustrate the presentation and characterisation of the territories –, and surveys in the form of semi-structured and structure interviews were also used to characterise the various structural dimensions of the elderly population in each territory, to be aware of and understand the relationships between the elderly and the territories. The interdisciplinary approach to the multiple relationships established between old age and territories enabled the identification of difficulties, vulnerabilities, needs and fears, on the one hand, and the conveniences experience by the elderly and the strategies they develop and use in their relationships with the territories. It was therefore easy to realise that territories can be a risk to the elderly in terms of their difficulty in access and mobility, and can adversely interfere with their social processes, isolating and making them more vulnerable. At the same time, having strong social horizontal ties can minimize the accessibility and mobility constraints within the territories. In that sense, there is a pressing need for a social change of paradigm based on the proposal for the development and implementation of an Ethics of Care, an attitude that should be developed on a daily basis in the relationships between the various subjects and social agents, based on the understanding that we are humans of care, caregivers and receivers at the same time. Having understood the logics in the various relationships experience and described by the elderly themselves enabled us to put forward strategy suggestions to facilitate the relationships between old age and territories, involving the various institutions and social actors, aiming to increase the quality of life for all people alike, and in particular the elderly.

Regarder les vieillesses à partir des territoires ; regarder les territoires à partir des vieillesses. C’est peut-être la phrase qui synthétise, en partie, cette étude. Ainsi, en partant des axes des mobilités, des accessibilités et des sociabilités, cette recherche a pour objectif d’identifier les interdépendances des rapports établis entre les personnes âgées et les territoires où elles vivent et construisent leurs liens, leurs quotidiens, leurs identités, en d’autres termes, d’identifier les influences mutuelles que les deux sujets abordés dans l’étude – vieillesses et territoires – exercent sur la gestion et le vécu aussi bien des vieillesses que des territoires eux-mêmes, à partir des rapports établis et vécus par et entre eux. Un plan méthodologique et conceptuel interdisciplinaire, dans lequel les disciplines des sciences sociales et humaines (anthropologie, sociologie, géographie, histoire, philosophie, éducation et psychologie) ainsi que les domaines de l’architecture et de l’urbanisme ont été convoqués pour que, chacun d’entre eux, au sein de ses propres spécificités, donne sa contribution à la compréhension et à l’interprétation des réalités observées, a été tracé pour atteindre cet objectif. Cette étude a été développée en quatre typologies territoriales différentes de la municipalité de Coimbra, deux typiquement urbaines – la zone "Haute" du centre historique, avec une histoire millénaire, et la zone de la "Solum", construite et développée à partir de la planification urbaine commencée au cours de la deuxième moitié du XXe siècle – et les deux autres avec des caractéristiques rurales, bien que géographiquement proches du centre urbain de la ville : la zone de "Botão" et la zone de "Casal do Lobo". La cartographie territoriale, à partir de critères géographiques, démographiques, architectoniques et urbanistiques, a été l’instrument choisi pour opérationnaliser tout le travail, permettant une meilleure et plus ample visualisation et lecture des réalités étudiées. Pour l’élaboration des cartogrammes, nous avons opté pour le recueil et l’analyse des données statistiques et documentaires. Des observations et des descriptions de chacun des territoires de l’étude – dont le registre photographique est utilisé ici comme moyen illustratif pour la présentation et la caractérisation des territoires – ont également été réalisées de même que des enquêtes, par le biais d’entretiens semi-structurés et non structurés en vue de caractériser dans ses dimensions structurantes, la population âgée par territoire et, surtout, de connaître et de comprendre les rapports entre les personnes âgées et les territoires. Le regard interdisciplinaire sur la multiplicité des rapports qui s’établissent entre vieillesses et territoires a permis de détecter, d’une part, les difficultés, les vulnérabilités, les besoins, les peurs, et de l’autre, les facilités vécues par les personnes âgées ainsi que les stratégies développées et utilisées par ces personnes dans leurs rapports avec les territoires. Il a ainsi été possible de comprendre que les territoires peuvent représenter un risque pour les personnes âgées, pour ce qui est des difficultés d’accès et de mobilité, en pouvant interférer, négativement, sur les processus sociaux, en les isolant et les vulnérabilisant. En même temps, des liens sociaux forts et horizontaux peuvent minimiser les difficultés d’accessibilité et de mobilité rencontrées dans les territoires. Pour cela, nous avons vérifié le besoin impérieux d’un changement social paradigmatique à partir de la proposition du développement et du vécu d’une Éthique du Soin, une politique qui doit être construite au quotidien dans les rapports entre les différents sujets et agents sociaux, avec la compréhension que nous sommes des êtres de soin, à la fois soigneurs et susceptibles d’être soignés. La compréhension des logiques établies dans les différents rapports vécus et signifiés par les personnes âgées elles-mêmes a permis l’élaboration de suggestions de stratégies facilitant les rapports entre vieillesses et territoires, impliquant les différentes instances et les divers acteurs sociaux afin de renforcer la qualité de vie de toutes les personnes et, en particulier, celle des personnes âgées

Contemplar la vejez desde el territorio, y contemplar el territorio desde la vejez. Esta puede ser la frase que sintetiza en buena medida este estudio. A partir de los ejes de movilidad, accesibilidad y sociabilidad, este estudio tiene como objetivo identificar las interdependencias en las relaciones que se establecen entre las personas mayores y el territorio en el que viven y construyen sus lazos, su vida cotidiana y su identidad, es decir, identificar las influencias mutuas que ambos sujetos del estudio —vejez y territorio— ejercen en la gestión y la vivencia tanto de la vejez como del propio territorio a partir de las relaciones por y entre ellos establecidas y vividas. Para alcanzar este objetivo, se diseñó un plan metodológico y conceptual interdisciplinar en el que se convocaron a las ciencias sociales y humanas —antropología, sociología, geografía, historia, filosofía, educación y psicología— y a la arquitectura y el urbanismo para que cada una de ellas, en sus propias especificidades, pudiera hacer su aportación a la comprensión y la interpretación de las realidades observadas. Este estudio se desarrolla en cuatro tipos de territorio del municipio de Coímbra, dos de ellos típicamente urbanos —la zona Alta del centro histórico milenario, y la zona del Solum construido y desarrollado a partir de la planificación urbana iniciada en la segunda mitad del siglo XX— y los otros dos con características rurales, aunque geográficamente próximos al centro urbano: la zona de “Botão” y la zona de “Casal do Lobo”. La cartografía territorial —diseñada siguiendo criterios geográficos, demográficos, arquitectónicos y urbanísticos— fue el instrumento elegido para realizar el trabajo, ya que permitió una mejor y más amplia visualización y lectura de las realidades estudiadas. Para la elaboración de los cartogramas se optó por recoger y analizar datos estadísticos y documentales. También se realizaron observaciones y descripciones de cada uno de los territorios del estudio —cuyo registro fotográfico se utiliza aquí para ilustrar su presentación y caracterización—, y encuestas mediante entrevistas semiestructuradas y no estructuradas que permitieron caracterizar las dimensiones estructurantes de la población de la tercera edad y, sobre todo, conocer y comprender las relaciones de los ancianos con su propio territorio. La mirada interdisciplinar sobre la multiplicidad de relaciones que se establecen entre la vejez y los territorios sirvió para detectar, por una parte, las dificultades, vulnerabilidades, necesidades y temores y, por la otra, los servicios a disposición de las personas mayores, y las estrategias desarrolladas y utilizadas por estos sujetos en sus relaciones con los territorios. De este modo, se pudo observar que los territorios pueden suponer un riesgo para las personas mayores por lo que respecta a las dificultades de acceso y de movilidad, y pueden interferir negativamente en sus relaciones sociales, aislándolas y volviéndolas vulnerables. Pero los fuertes lazos sociales horizontales pueden minimizar estas dificultades de acceso y movilidad encontradas en los territorios. En este sentido, se observó la imperiosa necesidad de introducir un cambio social paradigmático basado en el desarrollo y la vivencia de una ética del cuidado: una política que se debe construir día a día en las relaciones entre los diferentes sujetos y agentes sociales para permitirnos comprender que somos cuidadores y, a la vez, estamos necesitados de cuidado. La comprensión de la lógica de las diferentes relaciones entabladas por las personas mayores permitió sugerir estrategias facilitadoras de las relaciones entre vejez y territorio que implican a las diferentes instancias y actores sociales en la mejora de la calidad de vida de todos y, en especial, de los ancianos.