O Arrendamento Forçado de Habitações Devolutas como Expropriação de Sacrifício - O Confronto entre o Direito de Propriedade e o Direito à Habitação

Abstract

The recent years have been marked by a significant housing crisis, with increasing rental prices and rising monthly expenses associated with homeownership. Given this finding, and given the recognition of the right to Housing as a fundamental right, the State prepared a package of measures enshrined in Law 56/2023, dated October 6, aimed at restoring the lost balance in the house market. One of these measures is the Forced Lease of Vacant dwellings, which harbors a deep tension between the right to housing and the right to property. Therefore, i will seek to clarify in this investigation whether the measure, in itself, is admissible, considering the requirements imposed by the concept of expropriation for public utility, set out in art. 62.º CRP, and in light of the constitucional requirements that guide public action. To answer this question it is necessary to clarify preliminary points. It is imperative to frame the institute of letting and reflect on the controversial nature of the tenant’s right; it is essential to consider the intentionality behind diferent forced leasing regimes; a normative densification of fundamental rights in confrontation in this regime is required; and a deep reflection on the autonomy of the figure of sacrificial expropriation is indispensable, because only after these in-depth considerations will it be possible to solidly discern whether the forced lease of vacant houses can be attributed, or not, to the figure of expropriation for public utility, and if, as such, it is, on one hand, a regime that can be implemented in practice, and, on the other, a regime constitutionally permitted in our legal system, given the requirements of the principle of proportionality lato sensu.

Os últimos anos foram marcados por uma grande crise na habitação, com o aumento do valor das rendas e com o crescimento do valor dos encargos mensais associados à habitação própria. Perante esta constatação, e face ao reconhecimento do direito à habitação como direito fundamental, o Estado elaborou um pacote de medidas que veio a consagrar na lei 56/2023, de 6 de Outubro, e que têm em vista reestabelecer o equilíbrio outrora perdido no mercado da habitação. Uma dessas medidas é a medida do arrendamento forçado de habitações devolutas que alberga uma profunda tensão entre o direito à habitação e o direito de propriedade. Questiona-se se este instrumento, em si, é admissível face às garantias tuteladas pela noção de expropriação por utilidade pública, plasmada no art. 62.º CRP, e à luz das exigências constitucionais que pautam a atuação pública. Para responder a esta questão é necessário esclarecer pontos preliminares.É imperioso enquadrar o instituto da locação e refletir sobre a controversa natureza do direito do locatário; é fundamental ponderar a intencionalidade que preside aos diferentes regimes de arrendamento forçado; é exigida uma densificação normativa dos direitos fundamentais postos em confronto com esse regime; e é imprescindível uma profunda reflexão sobre a autonomização da figura da expropriação de sacrifício, porque só depois destes aprofundamentos será possível discernir com solidez se o arrendamento forçado de habitações devolutas é reconduzível, ou não, à figura da expropriação por utilidade pública, e se, como tal, é, por um lado, um regime implementável na prática, e, por outro, um regime constitucionalmente permitido no nosso ordenamento jurídico, ante as exigências do princípio da proporcionalidade lato sensu.