O objeto de tutela da conduta típica de representação realista de menores: consequências para o regime da tentativa impossível

Abstract

O presente estudo pretende proceder a uma interligação da conduta típica do crime de pornografia de menores com representação realista de menor (presente no artigo 176º nº 4 do Código Penal Português) com o regime da tentativa impossível. A própria expressão “representação realista de menor” já causou várias discussões e debate na doutrina, especificamente quanto ao bem jurídico presente nesta incriminação. A análise do bem jurídico tem relevância, nomeadamente, para saber sobre a legitimidade da punição das condutas em causa, especificamente quando nenhum menor está presente e para podermos chegar a uma conclusão sobre a aplicação do regime da tentativa impossível. A questão fulcral, neste âmbito, será saber se está em causa o bem jurídico liberdade e autodeterminação sexual, como parece apontado pelo próprio texto da lei, ou outro bem jurídico, quer individual, quer supra-individual, ou mesmo uma intenção de proteção da moralidade coletiva. Apesar do vasto debate sobre o bem jurídico em causa na incriminação, a doutrina, verdadeiramente, não se debruça sobre a interligação deste problema com o regime da tentativa impossível, deixando em aberto a questão de saber o que acontece quando o agente tenta produzir ou proliferar material com representação realista de menores, sem nenhum menor real estar presente, ou seja, quando estamos perante uma tentativa impossível por inexistência do objeto. A partir desta interligação importa saber se se justifica a punição da tentativa, se tal punição é de acordo com o princípio da intervenção mínima do direito penal (o princípio da ultima ratio do direito penal) e se a resposta a tal questão for negativa, a melhor forma de oferecer uma solução satisfatória a tal problema.

This study’s objective is to interconnect the conduct of the crime of child pornography with a realistic representation of a minor (present in nº 4 of the article 176º of the Portuguese Penal Code) with the regime of the “impossible attempt”.The expression “realistic representation of a minor” has brought about various doctrinal discussion, specifically in regard to what legal asset is present in this crime. The analysis of the legal asset matters, namely, to know about the legitimacy of the penalization of these conducts, specifically when no minor is present and so that we can reach a conclusion about the application of the regime of the impossible attempt.The fulcral question, in this scope, is to know if we’re dealing with the legal asset of sexual liberty and self-determination, as it seems to be appointed by the law’s own text, or another legal asset, either individual or supra-individual, or even an intention of protecting the collective morality.Despite the vast doctrinal debate around the legal asset in this crime, the doctrine truly does not deal with the interconnection of this problem with the regime of the impossible attempt, leaving open the question of knowing what happens when the agent attempts to produce or share material with a realistic representation of a minor, without any real minor being present, when we have in front of us an impossible attempt due to the inexistence of the object.From this interconnection we must know if it’s justifiable the criminalization of the attempt, if that criminalization is according to the principle of the minimal intervention of penal law (the principle of ultima ratio of penal law) and if the answer to that question is negative, the best way to offer a satisfactory solution to this problem.