Descentralização e Poder Local: Transferência de competências para os municípios

Abstract

Desde o início da história de Portugal que o município tem desempenhado um papel de destaque na organização da vida social e na satisfação das necessidades locais. Contudo, a evolução do município português foi pautada por diversas fases de retração e de expansão das suas atribuições, tendo em conta o sistema político vigente em cada época. Tendo sobrevivido a regimes monárquicos absolutistas e a uma ditadura de longa duração no século XX, períodos durante os quais nunca perdeu a sua importância, o município português viria a sua autonomia ser inequivocamente reafirmada com a restauração da democracia no país em 1976. Apesar da proteção constitucional concedida ao poder local, o processo de descentralização viria a ser adiado até aos dias de hoje. Em 2013, com a Lei nº 75/2013, a que se seguiu a Lei nº 50/2018 e uma série de diplomas setoriais, que regulam a transferência de competências em diversas áreas, iniciar-se-ia um profundo processo de descentralização e, consequentemente, de reforço do poder local português. No seu conjunto, este processo permitiu que os municípios passassem a desempenhar um papel relevante em matérias tradicionalmente entregues ao governo central. Apesar dos importantes ganhos económicos e políticos subjacentes a esta opção, nomeadamente graças ao melhor conhecimento das necessidades locais e da libertação do nível central para o tratamento de questões de âmbito nacional, a descentralização não está imune a alguns riscos. De entre estes, destacam-se a falta de preparação da classe política local para lidar com as novas competências e as deficiências financeiras, humanas e materiais dos municípios. O presente trabalho pretende realizar uma análise profunda à importância do município na história portuguesa e ao atual processo de descentralização, de modo a perspetivar o futuro desta autarquia local, apontando as principais preocupações e vantagens subjacentes.

Since the beginning of the history of Portugal, the municipality has played an important role in the organization of social life and in the satisfaction of local needs. However, the evolution of the portuguese municipality was marked by several phases of retraction and expansion of its powers, taking into account the political system in force at each period. Having survived absolutist monarchic regimes and a long-term dictatorship in the 20th century, periods during which it never lost its importance, the portuguese municipality would have its autonomy unequivocally reaffirmed with the restoration of democracy in the country in 1976. Despeite the constitutional protection granted to the local power, the decentralization process would be postponed until the present day. In 2013, with Law nº 75/2013, which was followed by Law nº 50/2018 and a series of sectorial diplomas, which regulate the transfer of competences in several areas, a profound process of decentralization would begin and, consequently, the strengthening of Portuguese local power. As a whole, this process allowed municipalities to play a relevant role in matters traditionally handed over to the central government. Despite the important economic and political gains underlying this option, namely thanks to better knowledge of local needs and the liberation of the central level to deal with national issues, decentralization is not immune to some risks. Among these, the lack of preparation of the local political class to deal with the new competences and the financial, human and material deficiencies of the municipalities stand out. The present work intends to carry out an comprehensive analysis of the importance of the municipality in portuguese history and of the current process of decentralization, in order to envision the future of this local authority, pointing out the main underlying concerns and advantages.