A dieta de uma comunidade religiosa feminina: estudo dos isótopos estáveis de carbono e azoto numa amostra do Mosteiro de Santa Clara-a-Velha de Coimbra

Abstract

O objetivo principal da presente dissertação consiste na caracterização da dieta das freiras clarissas do Mosteiro de Santa Clara-a-Velha de Coimbra, com uma cronologia definida entre os séculos XIV e XVII d.C., através da análise isotópica de carbono (C) e de azoto (N) no colagénio ósseo humano, realizada no laboratório Hércules, da Universidade de Évora. Foram selecionadas amostras ósseas pertencentes a 28 dos 81 esqueletos exumados do Mosteiro de Santa Clara-a-Velha e 16 amostras de fauna. Informações sobre a estimativa da idade à morte, a análise paleopatológica e o tipo de enterramentos foram recolhidas de modo a obter uma visão geral do estado de saúde, do modo de vida e do estatuto social destas freiras, assim como as informações sobre a sua dieta, obtidas através da investigação da composição isotópica dos esqueletos. Informações históricas, dados referentes à zooarqueologia e à arqueobotânica constituíram uma parte importante deste trabalho e permitiram uma interpretação sobre a vida desta comunidade. Os valores de δ13C e de δ15N demonstram que a alimentação das clarissas era bastante homogénea, principalmente entre as freiras com idades compreendidas entre os 35 e mais 50 anos. A dieta seria tipicamente terrestre, com base em plantas do tipo C3 e proteína animal, recorrendo a alguns recursos marinhos e provavelmente plantas do tipo C4, não se podendo descartar o consumo de recursos de água doce, devido à proximidade ao rio. Foram destacados dois casos com uma dieta distinta: o indivíduo 28.2 tinha uma alimentação com base, apenas, em plantas C3, e o indivíduo 61 teria uma alimentação com uma forte componente de recursos marinhos, e/ou de plantas C4, e/ou animais que consumiam plantas C4 (galinhas). As condições insalubres vividas no mosteiro, devido às recorrentes cheias, foram um impulso para o consumo da proteína animal terrestre, de modo a obter uma maior resistência ao frio. Esta dieta não refletia o que as regras religiosas ditavam, onde o consumo de peixe era essencial durante os vários períodos de abstinência.

The main purpose of this thesis focuses on the attempt to define the diet of the clarisses from the Monastery of Santa Clara-a-Velha of Coimbra, with a chronology between the XIV and the XVII centuries AD.For this purpose, stable isotope analysis of carbon (C) and nitrogen (N) were conducted, at the Hercules Laboratory, in Évora, on 28 of the 81 exhumed human skeletons, and analysis were also performed on 16 faunal samples. Estimation of age at death, pathological analysis and type of burials were investigated to obtain an overview of the health status, the type of life and the social status of these nuns, as well as their diet, obtained through a combined investigation of stable isotope composition of their skeletons. Historical, zooarchaeological and archaeobotanical information was also taken into account for interpreting the past way of life of this community.The values of δ13C and δ15N demonstrate that the diet of these nuns was very homogeneous, mainly among the nuns between the ages of 35 and >50 years. The diet was typically terrestrial, based on C3 plants and animal protein, resorting to some marine resources and probably C4 plants, without discarding the consumption of fresh water resources, due to the proximity to the river. Two cases were highlighted in which the diet did not resemble the rest of the group, where subject 28.2 had a diet based only on C3 plants, and individual 61 would have a diet with a strong component of marine resources, and/or C4 plants, and/or animals that consumed C4 plants (chickens).The unhealthy conditions of the monastery, due to the recurrent floods, were an impetus for the consumption of terrestrial animal protein, in order to gain more resistance. This diet did not reflect what religious rules dictated, where fish consumption was essential during the various periods of abstinence.