A violação dos valores fundamentais da União Europeia pelos Estados-Membros: o papel da ação por incumprimento

Abstract

The European Union, founded on the values of democracy, the rule of law and respect for fundamental human rights, as enshrined in Article 2 of the Treaty on European Union, has, over the last decade, come under unprecedented attack from within the international organization itself. Member States such as Poland and Hungary have promoted surgical and far-reaching legislative reforms in order to carry out an unparalleled violation of European values.The attacks on judicial independence perpetrated by Poland are just the tip of the iceberg of a much wider problem. The lack of respect for the rule of law, in addition to violations of freedom of expression, press and investigation, as well as the rights of women and sexual minorities, has reached unprecedented proportions within the European community, dealing a severe blow to the previously held view that all Member States respect the European values enshrined in Article 2 TEU, the European Convention on Human Rights, their national constitutions and, more recently, the Charter of Fundamental Rights of the European Union.The values common to all Member States, which are the sine qua non condition of membership of the European Union, as set out in Article 49 TEU, are no longer subject to strict control once the accession process has been completed. The "Copenhagen dilemma" thus exposes the weaknesses of the institutions in preventing and punishing deviations from the EU's axiological core.Article 7 TEU - as a political mechanism to prevent and penalize non-compliance with Article 2 TEU - has demonstrated its own ineffectiveness, largely as a result of the requirement for qualified majorities and unanimity among Member States. The existence of multiple offending States contributes decisively to an insurmountable blockage of the action of this instrument.The solution will therefore be to mobilize the infringement procedure provided for in Articles 258-260 TFEU. By using this mechanism before the Court of Justice, systematic violations of the Union's fundamental values and principles will be the object of the action, in a broader, panoramic approach, and no longer, as has classically been done, a single concrete violation.Without the need to create new legal instruments or revise the Treaties, the action for failure to fulfil obligations, combined with the application of Articles 2 and 4(3) TEU, is the way forward to rebuild Europe's bastions.

A União Europeia, fundada nos valores da democracia, do Estado de Direito e do respeito pelos direitos humanos fundamentais, plasmados no artigo 2.º do Tratado da União Europeia, tem, ao longo da última década, sofrido ataques sem precedentes vindos de dentro da própria organização internacional. Estados-Membros como a Polónia e a Hungria têm promovido cirúrgicas e profundas reformas legislativas com vista a levar a cabo uma inédita violação dos valores europeus.Os ataques à independência judiciária perpetrados pela Polónia são apenas a ponta do icebergue de um problema muito mais vasto. O desrespeito do Estado de Direito, a que se somam as violações da liberdade de expressão, de imprensa e de investigação, bem como dos direitos das mulheres e das minorias sexuais atingiu proporções nunca antes vistas no seio da comunidade europeia, desferindo um duro golpe no, até então, preconizado entendimento de que todos os Estados-Membros respeitam os valores europeus plasmados no artigo 2.º, TUE, na Convenção Europeia dos Direitos Humanos, nas suas Constituições nacionais e, mais recentemente, na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.Os valores comuns a todos os Estados-Membros que constituem a condição sine qua non de adesão à União Europeia vertida no artigo 49.º, TUE, deixam de ser alvo de um controlo rígido, concluído que esteja o processo de adesão. O “dilema de Copenhaga” expõe, assim, as debilidades das instituições na prevenção e punição de desvios ao núcleo axiológico da UE.O artigo 7.º, TUE – enquanto mecanismo político de âmbito preventivo e sancionatório de inadimplementos do artigo 2.º, TUE – demonstrou a sua própria ineficácia, em grande parte decorrente da exigência de maiorias qualificadas e unanimidades entre os Estados-Membros. A existência de múltiplos Estados infratores concorre decisivamente para um bloqueio inultrapassável da ação deste instrumento.A solução passará, pois, pela mobilização da ação por incumprimento, prevista nos artigos 258.º a 260.º, TFUE. Lançando mão deste mecanismo acionado junto do Tribunal de Justiça, constituirão o respetivo objeto as violações sistemáticas aos valores e princípios fundamentais da União, numa abordagem mais ampla, de panorama, e já não, como classicamente vem sendo feito, uma concreta e única violação.Sem necessidade de criação de novos instrumentos jurídicos ou de revisão dos Tratados, a ação por incumprimento, aliada à aplicação dos artigos 2.º e 4.º, n.º 3, TUE, assume-se como o caminho a percorrer com vista a reerguer os bastiões europeus.