A Fome como Arma de Guerra: Estudo de Caso do Tigray, na Etiópia

Abstract

“Uma criança que morre de fome é uma criança assassinada” (Ziegler, 2011). O estudo da insegurança alimentar e, naturalmente o desenvolvimento de estratégias para a sua resolução, tem vindo a ser analisado por vários teóricos ao longo do tempo, mas a verdade é que estamos cada vez mais longe de garantir o direito à alimentação a todos os cidadãos. A situação torna-se particularmente desalentadora face a contextos de conflitos armados, como é o caso da Etiópia, onde se verifica um padrão nos diferentes governos: a utilização da fome como uma arma de guerra. Desde o regime imperial até ao atual governo de Abiy Ahmed, é inegável a existência desta estratégia de usar a fome como um instrumento de limpeza étnica e de controlo político. No epicentro das grandes fomes que marcaram o país, nomeadamente nas décadas de 70 e 80, e recentemente em 2022, está a região do Tigray. Apesar de muitos atribuírem o problema da insegurança alimentar às alterações climáticas ou a um problema socioeconómico que afeta os níveis de pobreza e impede o desenvolvimento deste país, nesta dissertação de mestrado vamos observar como as fomes, que assolaram e continuam a assolar o Tigray, estão sobretudo associadas a um problema político entre diferentes etnias e grupos. O objetivo desta dissertação será, então, analisar o comportamento dos diferentes governos na forma como lidam com as insurreições populares, que acabam por se transformar em autênticos genocídios. Desde a negação da existência de fome, ao bloqueio da ajuda alimentar humanitária, e até mesmo a destruição de campos agrícolas, são várias as táticas usadas para exacerbar a insegurança alimentar na intenção de enfraquecer a oposição. É por este motivo que se torna pertinente analisar a questão da insegurança alimentar sem despolitizar a fome. É imperativo que a estratégia humanitária tenha em atenção o problema político existente que se espelha na violência perpetuada com base na etnia. Só desviando as atenções para o campo político é que será possível implementar, no Tigray, uma paz duradoura, livre de ajuda alimentar humanitária.

"A child who dies of hunger is a murdered child" (Ziegler, 2011). The study of food insecurity and the development of strategies to address it, has been analysed by various theorists over time, but the truth is that we are increasingly far from guaranteeing the right to food for all citizens. The situation becomes particularly disheartening in contexts of armed conflict, such as Ethiopia, where there is a pattern across governments: the use of hunger as a weapon of war. From the imperial regime to the current government of Abiy Ahmed, this strategy of using famine as an instrument of ethnic cleansing and political control is undeniable. At the epicentre of the great famines that have marked the country, notably in the 1970s and 1980s, and recently in 2022, is the Tigray region. While many attribute the problem of food insecurity to climate change or a socio-economic problem that affects poverty levels and hinders the development of this country, in this master's dissertation we will look at how famines which have ravaged and continue to ravage Tigray, are mainly associated with a political problem between different ethnicities and groups. The aim of this dissertation will then be to analyse the behaviour of different governments in dealing with popular uprisings, which end up turning into authentic genocides. From denying the existence of famine, to blocking humanitarian food aid, and even destroying agricultural fields, there are several tactics used to exacerbate food insecurity in order to weaken the opposition. This is why it is pertinent to analyse the issue of food insecurity without depoliticising hunger. It is imperative that the humanitarian strategy takes into account the existing political problem that is mirrored in the violence perpetuated on the basis of ethnicity. Only by diverting attention to the political arena will it be possible to implement a lasting peace in Tigray, free of humanitarian food aid.