Vitamina D - Relação com o estilo de vida e morbilidade

Abstract

Introdução: A vitamina D (VD) é uma hormona única, com efeitos pleiotrópicos, podendo ser adquirida através da dieta (colecalciferol ou ergocalciferol) ou sintetizada na pele, através da exposição solar (colecalciferol). Após a absorção e/ou síntese, passa para a circulação sanguínea e sofre uma hidroxilação a nível hepático, formando o calcidiol [25(OH)D]. Posteriormente, é hidroxilado a nível renal, passando à forma ativa da VD: calcitriol [1,25(OH)2D]. Este é metabolicamente dependente da paratormona e exerce funções em praticamente todas as células, o que é corroborado pela ampla expressão dos seus Vitamin D Receptors (VDR). O calcitriol estimula a absorção intestinal de cálcio e fósforo, a reabsorção renal de cálcio e a mobilização de cálcio e de outros minerais do osso. O calcitriol tem muitas outras funções biológicas, entre elas a inibição da proliferação celular e da angiogénese e o estímulo da produção de insulina. Nas últimas décadas, a temática da VD tem estado em ampla discussão, especialmente no que concerne a eventuais benefícios a nível de prevenção de doenças e promoção da saúde e do bem-estar. Os baixos níveis séricos de calcidiol poderão estar associados a um risco aumentado de diversas patologias, nomeadamente autoimunes, neoplásicas, cardiovasculares, neurológicas. Os benefícios da suplementação de VD também tem sido alvo de forte discussão, pois, por um lado, ainda está por comprovar a relação causa-efeito entre o défice de VD e a patologia não esquelética e, por outro lado, se é uma medida custo-efetiva. Contudo, o benefício da suplementação já foi demonstrado na prevenção de fraturas osteoporóticas e quedas, bem como na prevenção de diabetes mellitus em indivíduos com pré-diabetes. Objetivos: avaliar a relação entre os níveis séricos de VD e determinadas variáveis sociodemográficas, estilo de vida e morbilidades; avaliar o consumo médio diário de VD. Métodos: Foi aplicado um questionário a 576 utentes, entre os 18 e os 80 anos, da Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados de Seia (concelho – Seia; distrito – Guarda; 40º de latitude Norte). Foi recolhida informação clínica relevante de cada utente e solicitada a análise laboratorial da concentração sérica de 25(OH)D. Resultados/Discussão: Na amostra em estudo, 69.6% dos utentes apresentaram níveis séricos de 25(OH)D ≤ 50 nmol/L, compatíveis com “Deficiência”. O valor médio calculado para a amostra foi de 41.5±18.1 nmol/L, o que está, claramente, abaixo do recomendado pela Direção-Geral da Saúde. Além de terem sido encontradas relações estatisticamente significativas, e já esperadas, para as variáveis “idade” (p=0.001), “sazonalidade” (p=0.001) e “tempo de exposição solar” (p=0.045), também se verificou a mesma condição para “atividade profissional” (p=0.005) e “conhecimento sobre VD” (p=0.018). Quanto ao consumo estimado de VD, observou-se uma média de 144.7±39.8 UI, com uma diferença estatisticamente significativa para a variável “sexo” (p=0,004). Para os “antecedentes patológicos”, foram encontradas relações estatisticamente significativas para “Depressão” (p=0.04), “Dislipidemia” (p=0.024), “Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica (DPOC)” (p=0.044) e “Neoplasias Malignas” (p=0.023). Nestas patologias, a deficiência de VD pode ser um fator predisponente para a sua ocorrência ou uma consequência da própria patologia. Conclusão: Neste estudo, a maioria dos utentes revelou deficiência em VD, pelo que deve ser promovida uma educação para a saúde da população no sentido de adotar hábitos de vida saudável que possibilitem incrementar os níveis séricos desta vitamina, nomeadamente a ingestão de ovos e peixes gordos e uma exposição solar moderada e responsável. De salientar que, mesmo adotando este tipo de medidas, é difícil atingir-se níveis séricos iguais ou superiores a 75 nmol/L, fundamentais para que ocorra uma correta homeostasia de todos os sistemas do organismo. Após a realização deste trabalho, propõe-se que seria benéfica a suplementação universal de VD em alimentos básicos, como farinhas e leite, dado que se trata de alimentos baratos e de uso universal. Esta seria, simultaneamente, uma forma de redução de incidência de patologias crónicas, de melhoria da qualidade de vida da população e de redução dos gastos em saúde. Tendo em consideração os resultados obtidos, com particular ênfase na possível relação entre o défice de VD e Depressão, Dislipidemia, DPOC e Neoplasias Malignas, sugere-se a realização futura de estudos-satélite, com vista à ampliação dos conhecimentos nesta área.

Introduction: Vitamin D (VD) is a unique hormone, with pleiotropic effects, and can be acquired through the diet (cholecalciferol or ergocalciferol) or synthesized in the skin, through sun exposure (cholecalciferol). After absorption and/or synthesis, it passes into the bloodstream and undergoes hydroxylation in the liver, forming calcidiol [25(OH)D]. Subsequently, it is hydroxylated renally, turning into the active form of VD: calcitriol [1,25(OH)2D]. This is metabolically dependent on parathyroid hormone and exerts functions in practically all cells, which is corroborated by the wide expression of its Vitamin D Receptors (VDR). Calcitriol stimulates intestinal absorption of calcium and phosphorus, renal reabsorption of calcium, and mobilization of calcium and other minerals from bone. Calcitriol has many other biological functions, including inhibiting cell proliferation and angiogenesis and stimulating insulin production. In recent decades, the topic of VD has been widely discussed, especially with regard to possible benefits in terms of disease prevention and promotion of health and well-being. Low serum levels of calcidiol may be associated with an increased risk of various pathologies, including autoimmune, neoplastic, cardiovascular and neurological diseases. The benefits of VD supplementation also have been the subject of strong discussion, as, on the one hand, the cause-effect relationship between VD deficit and non-skeletal pathology has yet to be proven and, on the other hand, whether it is a cost-effective measure. However, the benefit of supplementation has already been demonstrated in the prevention of osteoporotic fractures and falls, as well as in the prevention of diabetes mellitus in individuals with prediabetes. Objectives: to evaluate the relationship between serum VD levels and certain sociodemographic variables, lifestyle and morbidities; to evaluate the average daily consumption of VD. Methods: A questionnaire was administered to 576 users, between 18 and 80 years old, registered in the Personalized Health Care Unit of Seia (municipality – Seia; district – Guarda; 40º North latitude). Relevant clinical information was collected from each user and laboratory analysis of serum 25(OH)D concentration was requested. Results/Discussion: In the study sample, 69.6% of users had serum 25(OH)D levels ≤ 50 nmol/L, compatible with “Deficiency”. The average value calculated for the sample was 41.5±18.1 nmol/L, which is clearly below that recommended by the Direção-Geral da Saúde. In addition to having found statistically significant relationships, and already expected, for the variables “age” (p=0.001), “seasonality” (p=0.001) and “sun exposure time” (p=0.045), the same condition was also verified for “professional activity” (p=0.005) and “knowledge about VD” (p=0.018). Regarding the estimated consumption of VD, an average of 144.7±39.8 IU was observed, with a statistically significant difference for the variable “sex” (p=0.004). For “pathological antecedents”, statistically significant relationships were found for “Depression” (p=0.04), “Dyslipidemia” (p=0.024), “Chronic Obstructive Pulmonary Disease (COPD)” (p=0.044) and “Malignant Neoplasms” (p=0.023). In these pathologies, VD deficiency may be a predisposing factor for their occurrence or a consequence of the pathology itself. Conclusion: In this study, the majority of users revealed a deficiency in VD, which is why health education should be promoted to the population in order to adopt healthy lifestyle habits that make it possible to increase serum levels of this vitamin, namely the intake of eggs and fatty fish, and moderate and responsible sun exposure. It should be noted that, even adopting these types of measures, it is difficult to achieve serum levels equal or greater than 75 nmol/L, which are essential for correct homeostasis of all the body's systems. After carrying out this work, it is proposed that universal supplementation of VD in basic foods, such as flour and milk, would be beneficial, given that these are cheap foods with universal use. This would be, simultaneously, a way of reducing the incidence of chronic pathologies, improving the population's quality of life and reducing health spending. Considering the results obtained, with particular emphasis on the possible relationship between VD deficit and Depression, Dyslipidemia, COPD and Malignant Neoplasms, it is suggested that satellite studies be carried out in the future, with a view to expanding knowledge in this area.