A metalurgia do povoado de Pragança, Cadaval no contexto da idade do bronze/I Idade do Ferro na Estremadura. A colecção do Museu Nacional de Arqueologia

Abstract

A tese que agora apresentamos à Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, para obtenção do grau de Doutor em Arqueologia debruça-se sobre o estudo da coleção de artefactos metálicos em liga de cobre e restos de produção metalúrgica do povoado de Pragança, Cadaval, no contexto da Idade do Bronze e I Idade do Ferro, coleção essa que integra o acervo do atual Museu Nacional de Arqueologia desde finais do século XIX. Apesar de constituir uma das mais vastas coleções de artefactos metálicos pré e proto-históricos no acervo do Museu Nacional de Arqueologia, com mais de três centenas de artefactos, fragmentos e restos de produção, é ainda mal conhecida e, sobretudo, nunca foi feito um estudo do conjunto integral das peças. Paralelamente, foi estudado, no plano arqueometalúrgico e da própria história das investigações em Pragança, um pequeno conjunto, residual em termos numéricos, de artefactos metálicos provenientes de Pragança e atualmente em depósito no Museu Municipal de Faro, constituindo o único conjunto de artefactos metálicos de Pragança, recolhidos em finais do século XIX, que não integra o acervo do Museu Nacional de Arqueologia. Foi nosso propósito com este projeto de investigação, cujos resultados agora apresentamos, dar a conhecer à comunidade científica o conjunto dos artefactos metálicos do povoado de Pragança, com incidência especial na Idade do Bronze e I Idade do Ferro, numa perspetiva pluridisciplinar, com especial relevo para o estudo arqueometalúrgico dum considerável número de artefactos e restos de produção metalúrgica. O povoado de Pragança, mais conhecido como “Castro de Pragança” situa-se no concelho do Cadaval e foi identificado em 1893 por J. Leite de Vasconcelos, fundador e primeiro diretor do atual Museu Nacional de Arqueologia. Nesse mesmo ano iniciaram-se as intervenções arqueológicas no sítio do “Castelo” que, posteriormente, J. Leite de Vasconcelos passou a designar como “Castro de Pragança”. Os inúmeros materiais aí recolhidos, não só artefactos metálicos, mas também cerâmicas e artefactos líticos, vieram a integrar o espólio do então Museu Etnológico Português e atual Museu Nacional de Arqueologia. A descoberta em finais do século XIX de tão importante sítio levou a intervenções arqueológicas mais regulares até aos inícios do século XX, verificando-se um certo “abandono” desta estação após a morte de José Leite de Vasconcelos. As intervenções arqueológicas aí realizadas foram esporádicas até ao final da década de oitenta do século passado, quando J. L. Marques Gonçalves retoma escavações sistemáticas no povoado durante duas campanhas. Estas questões levaram-nos a dar uma particular atenção à história das investigações em Pragança, a uma exaustiva recolha documental no Arquivo Histórico do MNA e no Arquivo Pessoal de J. Leite de Vasconcelos para obtermos toda a informação possível que permitisse um melhor enquadramento do sítio e respetivos materiais. Embora não tenhamos efetuado qualquer intervenção arqueológica em Pragança, não quisemos deixar de enquadrar este povoado no contexto da Estremadura e da realidade do povoamento desta região no período cronológico em estudo, mas também sem esquecer a relevância dos povoados fortificados Calcolíticos nesta região, já que Pragança, no Calcolítico, insere-se no conjunto de povoados fortificados estremenhos. Na Idade do Bronze e I Idade do Ferro, a realidade foi necessariamente outra, como também teremos ocasião de explanar. Podemos afirmar que o estudo tipológico de todos os artefactos em liga de cobre e restos de produção metalúrgica ocupa uma parte significativa do trabalho, como não poderia deixar de ser dado o volume de artefactos manipulados. A par deste estudo tipológico, com tudo o que ele inclui, desde a classificação das peças, à identificação de paralelos e possíveis redes de trocas, foi realizado um estudo arqueometalúrgio dum conjunto significativo de peças que se desenvolveu ao longo de vários anos em parceria com a Doutora Maria de Fátima Araújo, do extinto Instituto Tecnológico e Nuclear e, mais recentemente, com o Doutor Carlo Bottaini do Laboratório HERCULES, Universidade de Évora. A caracterização química das ligas metálicas e processos de produção metalúrgica revestiu-se de particular relevância, tanto mais que são escassos os dados disponíveis para as escavações realizadas em Pragança, com exceção daquelas efetuadas na década de oitenta do século passado pelo arqueólogo J. L. Marques Gonçalves. Por fim e tendo presente que a evidência da ocupação da Idade do Bronze e I Idade do Ferro no povoado de Pragança continua a ser um tema bastante problemático e que levanta mais questões do que aquelas que podem ser esclarecidas, não pudemos deixar de nos debruçar sobre as rotas de circulação de matérias primas e dos artefactos metálicos que puseram esta região do extremo ocidental peninsular em contacto com o mundo mediterrâneo, mas também com a Europa transpirenaica e transalpina, esperando que este longo caminho percorrido possa trazer uma melhor compreensão do que representou a metalurgia e a sua produção no povoado de Pragança, com particular incidência na Idade do Bronze e I Idade do Ferro.