UMA ETNOGRAFIA DAS SAÍDAS DO ARMÁRIO EVANGÉLICO: Os reflexos do patriarcado, da heteronormatividade e da homofobia na teologia e prática no Brasil

Abstract

This thesis focuses on the study of men and women, cisgender, identified as gay, lesbian and/or bisexual, inside contemporary evangelical churches. The focus of the analysis is the process of “coming out of the closet” experienced by these men and women who professed the evangelical faith at the time of their “coming out,” in order to make a qualitative assessment of the overall climate of acceptance or not of sexual diversity in Brazilian evangelical churches.To this end, the thesis investigates the theological doctrines and practices of historical, Pentecostal and neo-Pentecostal churches, giving voice to “coming out of the evangelical closet” experiences in three Brazilian cities: São Paulo/SP, Resende/RJ and Marabá/PA. This study takes place in a larger context of increasing complaints of religious intolerance in Brazil and increasing perception of intolerance and polarization. At the same time, Brazil is undergoing a process of religious transition with the growth of the evangelical population in the country. This thesis makes a contribution to the ethnographic analysis of sexual diversity intolerance in the contemporary evangelical movement. It offers a qualitative assessment of the extent to which there was progress in attitudes towards sexual diversity in evangelical communities and it can be used to support future strategies to reduce homophobia in Brazil, expanding the protection of human rights to non-heterosexual individuals. The thesis identifies two main proposals currently practiced in evangelical communities regarding the acceptance of sexual diversity: inclusion conditioned to a kind of vow of chastity; and an affirmative reception, with lesser adherence, which proposes a reception that includes and affirms sexual diversity as part of individuality, and therefore deconstructs the argument that God rejects other sexualities outside the heterosexual one. I propose an analysis of conflicts over inclusive or affirmative care of sexual diversity in evangelical churches, and I show how pastors who openly advocate inclusive care have done so as part of an attempt to break away from approaches of exclusion or attempts at sexual reorientation. However, this attempt to break away from religious intolerance and symbolic violence has not been efficient in constructing a more welcoming and humane evangelical community because it turns the process of acceptance into a dynamics of silencing, conditioning and castration.These arguments have important practical implications in light of the fact that despite international advances regarding increasing tolerance towards sexual diversity, Brazil still has a very fragile and unstable system of protection of sexual minority groups that obstructs the construction of a truly inclusive cultural, religious, and juridical environment that effectively opposes homophobia and related violent forms of intolerance towards sexual diversity.

A pesquisa debruça-se sobre o estudo de homens e mulheres, cisgéneros, identificados como gays, lésbicas e/ou bissexuais, no seio das igrejas evangélicas contemporâneas. O principal enfoque de análise é o processo de saída do armário desses indivíduos que professavam a fé evangélica à época de sua publicitação, visando compreender o cenário de acolhimento, ou não, da diversidade sexual em igrejas evangélicas brasileiras.Para isso, foram investigadas teologias e práticas em doutrinas históricas, pentecostais e neopentecostais, analisando experiências e discursos tanto de saídas do armário gospel quanto de líderes religiosos de três cidades brasileiras: São Paulo/SP, Resende/RJ e Marabá/PA. Este estudo se dá num cenário de crescimento do número de denúncias de intolerância religiosa no Brasil, da perceção do crescimento da intolerância e polarização, de um cenário de transição religiosa com o crescimento da população evangélica no país, e contribui fornecendo uma análise etnográfica contextual e comparativa da homoafetividade no movimento evangélico, ao identificar se tem havido avanço quanto ao conhecimento e abordagem do tema nas comunidades de fé, servindo inclusive para embasar futuras estratégias para redução da homofobia no Brasil, ampliando a proteção dos direitos humanos a este grupo. Como resultados, identifiquei duas principais propostas praticadas atualmente em comunidades evangélicas quanto ao acolhimento à diversidade sexual: a inclusão condicionada a uma espécie de voto de castidade; e um acolhimento afirmativo, de menor adesão, que propõe um acolhimento que inclui e afirma a diversidade sexual como parte da individualidade, e portanto, desconstrói o argumento de que Deus rejeita outras sexualidades fora da heterossexual. Acompanhando os conflitos a respeito do acolhimento inclusivo ou afirmativo da diversidade sexual em igrejas evangélicas, observei que pastores que defendem abertamente o acolhimento inclusivo o fizeram como tentativa de romper com uma abordagem de exclusão de membros ou de tentativas de reorientação sexual. Entretanto, essa tentativa de romper com a violência religiosa não tem sido eficiente em construir um evangelicalismo mais acolhedor e humano porque transforma o acolhimento num processo de silenciamento, condicionamento e castração.Trata-se de um assunto de extrema relevância, tendo em vista que apesar dos avanços internacionais no que se refere à garantia do respeito a qualquer pessoa, independente de fé, identidade de género ou orientação sexual, o Brasil ainda apresenta uma proteção muito frágil e instável a estes grupos, obstruindo a construção de uma cultura, de religiões e de um judiciário que se oponha à homofobia.